Procedimento contestável

 

Este site foi criado para veicular a contestação à mais recente ação lançada pela Direção-Geral de Energia e Geologia (DGEG), de “participação pública” sobre um pedido de pesquisa e prospeção de depósitos de minerais num espaço a que chamaram “Montemor” (ou “Montemor-o-Novo”). Logo de seguida, surgiu novo pedido com a designação “Moura-Ficalho2”.

Pensamos ser claro que quem se propõe fazer estas pesquisas não são organizações com fins científicos, nem beneméritos de algum modo preocupados com o conhecimento do que existe, para prevenir ou melhorar as condições que venham a encontrar. A intenção é apenas o lucro dos seus acionistas, mesmo à custa do fim de muitas formas de vida, poluição permanente de solos e água durante séculos, agravamento da desertificação climática, compromissos financeiros públicos na monitorização e controlo dos danos.

A lei exige que as empresas que fazem estes pedidos sejam “idóneas”. A DGEG considera que só a ela cabe decidir sobre essa idoneidade. De uma empresa recém-constituída, com um capital de 500 euros. É contestável.

A documentação que chega ao público é lamentavelmente pro forma. A empresa delimita um polígono num mapa e não cuida de dizer onde vai precisamente intervir, por onde vai transitar pessoas e máquinas, não se compromete em avisar prévia e atempadamente os cidadãos e os empresários de prazos para intervenções concretas. “Entre 3 e 5 anos”, é desrespeito. A DGEG recebe esse relatório e divulga-o como suficiente. É contestável.

O polígono da empresa passa por cima de zonas protegidas, de património cultural, de habitats de espécies protegidas e espera que alguém a impeça. O cidadão comum que habita nesse polígono fica, assim, nas mãos de um Estado que se limita a dizer: cumpram-se as leis. Mas que, diz-nos a experiência, falha em toda a linha na fiscalização. O método é, pois, contestável.

Sendo a terceira consulta numa década, está clara a não adesão à exploração mineira na zona de Monfurado. Proprietários, empresários de diversos quadrantes económicos, políticos, trabalhadores e habitantes da zona proposta para pesquisa tiveram uma recetividade à contestação completamente diferente de momentos anteriores. Há hoje, manifestamente, uma consciência sobre as possibilidades de prosperidade económica em zonas protegidas e sobre a aberração que constitui a extração de minérios em minas a céu aberto. E nota-se a diferença de comportamento nas áreas que foram acrescentadas ao anterior pedido de intervenção, mais passivas, menos alertadas para os riscos que correm. O tempo da consulta pública é demasiado curto para divulgar sequer a existência… de uma consulta pública.

Quanto à participação ativa no processo de consulta de “Montemor”, agora encerrado, houve 172 participações. Haveria, por certo, mais, se o funcionamento do portal fosse mais elementar. O registo é complexo, tem um tempo de espera para se chegar a, finalmente, dizer se se concorda ou discorda, com quadros de permeio que não interessam para a situação. Há que simplificar o procedimento, se querem, realmente, que haja mais participações.

Apraz ver posições firmes das Câmaras Municipais de Montemor-o-Novo, de Évora e de Alcácer do Sal em defesa do conjunto do seu território, numa compreensão de que dividi-lo em talhões protegidos equivale a matá-los. Será uma lição a espalhar aos outros concelhos ameaçados.

Interessante foi ver o “despertar” da Universidade de Évora para o tema. Em 2013, quase todas as portas se nos fecharam. Na verdade, não foi só nos contactos com professores de Évora, mas de todo o país, aos quais pedíamos para nos ensinarem a ler o Estudo de Impacte Ambiental. Registámos duas singelas exceções. Desta vez, não os procurámos para nos ensinarem, apenas perguntámos se sabiam da consulta. E a questão gerou, finalmente, um saudável início de polémica, que, esperemos, não se desvaneça. As empresas mineiras não vão desistir e é bom que a academia parta de posições mais informadas, para as partilhar com os cidadãos – o que também é sua atribuição.

O mundo está a braços com a maior crise ambiental da história da humanidade, temos o planeta em risco de sobrevivência: precisamos de atividades económicas que façam uma melhor gestão dos recursos hídricos e que baixem a pegada ecológica. Onde é que as minas a céu aberto contribuem para isso?

Por agora, resta-nos aguardar o que vai a DGEG fazer com estas participações.